O meu Blog

O Blog "Verba Volant, Scripta Manent" foi criado no âmbito de um exercício académico. Desde então, e por forma a dar alguma continuidade à experiência iniciada na blogosfera, mantém o objectivo de partilhar alguns textos pessoais, bem como outros materiais literários do nosso interesse.

Todos os comentários, sugestões ou críticas serão sempre bem-vindos!

Porque as palavras faladas voam... e a palavra poética, tantas vezes, fala por si... e permanece... sempre!

sábado, 28 de dezembro de 2013

Ícaro fui em terras que não eram minhas
à velocidade de um deslize
caí inteiro, de rompante
resvalei, cadente
sem asas sem rede

alguém cantarolou uma música alegre
que me fez levantar a cabeça

e a queda?
não foi assim tão grande
ainda tenho sete vidas por viver 

(Troyka Manuel)

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Cesário Verde (in memoriam)

Olho as luzes longínquas
onde a vida acontece e se faz.
Permanentemente.
Guardo a memória do calor,
a lembrança de um olhar,
o sorriso de ouro fundido.

É quase madrugada
e o mundo pára... deixa de ouvir
as melodias do Encontro-Agora,
o brilho térreo, a vida galopante, 
o tilintar dos copos felizes.

Horas mortas que se escondem
(e nos escondem abrigados de nada),
horas vãs, vazias, veladas.
Tudo se transforma 
em bruma poeirenta e húmida,
frio caldoso de uma chuva memorável
que nunca chegou a cair.


(Troyka Manuel)

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Subimos a estreita escada
de um edifício inexistente
e acreditámos que a subida era real,
desejada e perfeita.

Estreitos não se devem dobrar,
a menos que haja uma certeza…
a certeza de não estarmos sós.
(TM)

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

térreos limites de uma só vida
condenados ou condecorados?
vistas largas se anunciam
o sol vai alto

“- Mais luz!”

e os livros abrem as suas páginas
até ao infinito
(Troyka Manuel)

sábado, 14 de dezembro de 2013

A partida transporta a vida num gesto
e o adeus, um breve aceno (um abraço esquecido),
toldam-me os olhos enevoados.
Cinzelei os meus dedos nos dedos teus
e a mão desfez o molde que nos criou,
quebrado, desconcertado.

Num cruzamento encontrei-te a vida,
mas as torres desnortearam os seus sentidos,
paralelas vias se tornaram.
(Olho-te de longe…
Em atalaia cada vez mais vaga…)
O medo escureceu os teus olhos,
espantou tu’alma de embarcação fria,
obliterada nos teus nós intransponíveis.
Fiquei à porta dessa muralha. Espero. Ainda…

Raiz acesa de uma árvore já morta,
malha de cordas que me abismou,
ensimesmada teia onde quis entrar.
Tudo vive e encanta
e depois… assembleia vácua de gente viva.
Apenas a chuva me queima o rosto gasto,
todo o prado do sentir na tua muralha-escudo me ficou.

É mais fácil partir, encerrar as entradas,
abandonar o porto-salvo-abrigo. Partir...
Os bandos também seguem para o Sul.
Chegam todos? Chegamos todos!
Mas ninguém ousa permanecer.
(Troyka Manuel)

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

a memória do tempo
traz consigo a maresia de outro espaço
redonda, insulflada de encantos
odores pintados em céu aberto
colo de Antiguidade perdida
arrancada das entranhas
prenhes de esperanças

o dia azul de cinzento se estreou
ávido de um arco-íris
que nunca chegou
(Troyka Manuel)

domingo, 8 de dezembro de 2013

enleadas mãos no sonho de uma viagem
toque
quente

seguiu
bruma

não volta para trás

(Troyka Manuel)

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

RIP Madiba

Não podia deixar de fazer uma homenagem a este grande Senhor!
Requiescat in Pace, Madiba!

Poema que o inspirou nos anos em que esteve preso:
INVICTUS
 
Dentro da noite que me rodeia
Negra como um poço de lado a lado
Agradeço aos deuses que existem
por minha alma indomável

Sob as garras cruéis das circunstâncias
eu não tremo e nem me desespero
Sob os duros golpes do acaso
Minha cabeça sangra, mas continua erguida

Mais além deste lugar de lágrimas e ira,
Jazem os horrores da sombra.
Mas a ameaça dos anos,
Me encontra e me encontrará, sem medo.

Não importa quão estreito o portão
Quão repleta de castigo a sentença,
Eu sou o senhor de meu destino
Eu sou o capitão de minha alma.


William Henley

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A propósito de uma voz de falsete

Foge-me a saída e não conheci a entrada,
o compasso afinado de quem pensa
circulou-me a forma informe.
O pião rolou num sem fim de chão
e a moeda não chegou a cair.
"Cara ou coroa?"
Sérias dúvidas à sorte lançadas…
Da arte não conheço nada,
mas os meus olhos curiosos
seguem de perto alguns versos brancos.

Entre Versailles e CCB’s
transfiguram-se coloridos tons e melodias
em falsetes agudos-perfeitos.
São os muros da memória sacra,
abertos à História que se estende ao sol,
engenhosamente barrocos
ou escrupulosamente clássicos.
A voz, a melodia, o teatro, a literatura…
A vida partilhada e distribuída por todos os cantos!
E o que é tudo isto, senão a verdadeira Arte Total?!
(Troyka Manuel)


domingo, 1 de dezembro de 2013

Despertar

Cresce um fumo tardio nas horas lentas,
afugentam-se os bichos, a derradeira luz do dia.
Serve o abismo aos homens loucos,
retardados, génios ou coristas.
Imprimo a devoção titânica do devir,
a concha, a espuma, a areia que se escorre.

Todo o medo se mede e se move
na intransponível praia de ti,
ilha isolada em névoa fechada.
E aí te encolhes em fuga quieta.
Inquietante estado de alerta.
Pânico! 
E permaneces, porém. 
Só de alma molhada. 

Escreve uma carta de despedida
e segue a luz que te chama!
Acorda! Ressurge! Canta e grita!
Solta os grilhões que te impedem de ver.
Abram alas! Abram pórticos e portadas!

É hora! É hora!
Renasce a besta sadia,
o caos em gravidez de risco,
a vida inteira em descoberto!

(Troyka Manuel)


sábado, 30 de novembro de 2013

[Corro]

Corro,
atrapalho-me,
grito,
defendo-me.

Caminho,
descalço-me,
abraço,
repito-me.

As mãos insistem…
Os pés conhecem o trilho…

Troyka Manuel)
12-08-2013



sábado, 23 de novembro de 2013

[só conseguia amar-te se falasse de mim] Al Berto

só conseguia amar-te se falasse de mim
sem cessar

hoje vivo quase sempre sozinho
paciência
os momentos de infelicidade estão esquecidos

uma pétala de luz percorre as linhas da mão
o rosto é aquele que sonhei
e não o que a noite dos espelhos tenta dar-me

eis o retrato de meu único amigo
a quem tudo revelo
o que me cresceu no coração


Al Berto

in Uma existência de papel

As pessoas sensíveis (Sophia)


SOPHIA DE MELLO BREYNER

As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra

«Ganharás o pão com o suor do teu rosto»
Assim nos foi imposto
E não:
«Com o suor dos outros ganharás o pão»

Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito

Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem

In Livro VI - III - As Grades

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Tραγῳδία (Gr. Tragédia)

Cai a noite na sua severidade terrível,
a luz ausente, as sombras cavernais
inimigas do arquétipo.
São fachos de luz que se apagam
num trémito e pérfido acesso trágico.

Cai o fulgor,a sombra,
fundem-se o céu e o mar
numa irmandade incestuosa
e os limites (barreiras do palpável)
deixam de ser regulares e tangíveis.
Tudo estremece na noite escura.
Tudo é pardo, informe e medonho.

Só a luz-dia do devir
pode trazer a chama roubada,
eterna vítima do olhar, 
para sempre opaca em transparência. 

(Troyka Manuel)

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Πρoμηθεύς δεσμώτης (Prometeu Agrilhoado)

(a elaborar um trabalho sobre "Prometeu Agrilhoado" de Ésquilo)

Agrilhoado imperador dos mortais
(mestre, criador, sopro de vida!),
a solidão habita o rochedo onde pereces,
vazio de alma, em lume agora apagado.
Castigado titã de amor incondicional,
homem-quase de humanidade que se dá,
duelo imortal em prisão condenado.

Soltam-se mudos os teus gritos
em águia teimosa que te arremessa
e a coragem te expia
e a coragem te castiga.
Arde o fogo por ti roubado,
esperançoso, vivo e eterno.
O teu grilhão é de ouro perene,
dádiva infinita de saber.
És princípio, és vida, filho da Terra!

Vem, previdente Prometeu!
Ganha as minhas asas
e volta a esta Luz que é tua!  

(Troyka Manuel)

sábado, 26 de outubro de 2013

De scripto [Latim - Sobre a escrita]

escrevo sem tela nem lápis
nas tépidas nuvens que me enleiam
embriagado na lucidez real
de alguém que conhece o tempo
e se resvala num espaço que não é seu


escrevo sem fim
sem pressa
acordado em sonho de viagem
desejo inspirado, tábua rasa
de razões impalpáveis
oprimidas, recalcadas
força de multidão entediada
em cortante e crua lâmina



escrevo de mim
a cores ou branco e preto
o que não conheço
âmago silêncio que brota
de uma asa quebrada
em pena contrita
escravidão que (se) sabe 
e cheira a liberdade
(Troyka Manuel)

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

[Cabe um homem na negra noite]

Cabe um homem na negra noite
confusa, trémula de luar?
Cabe um céu no tempo finito de acontecer?
Cabe um desejo no tempo em que partir
é chegar, é cair?

Cabe um homem?
Cabe um céu?
Cabe um desejo?

Cabe a vida e cabe o homem.
(Cabe a vida?)
Tudo cabe, como perder
é ganhar asas-de-tentar!
(Troyka Manuel)



sábado, 12 de outubro de 2013

"O que vemos, o que nos olha" (Título do Livro de Didi-Huberman)

Da persistência nasce a obra,
o entendimento, a olhar que nos olha.
Exactidão perscrutada, perfeição do ser quase
em instante de solidão que se arremessa
e se atira para o vácuo buraco olvidado.

On jette toujours un coup d’oeil.
À tout! À tous!

E espreitamos assim – sempre! –
o abismo, as rochas, o mar profundo,
o espelho côncavo que nos reflecte.
Fixam-se os olhares, intensifica-se a atenção
qual lugar para onde, projecção ilimitada
- espaço de reciprocidade infinda e inabalável-,
metamorfose do celeste númen
ao canto de uma estrada,
por entre roupas usadas e andrajosas.
O Caos, a vida repentina e estonteante
envolta de divinos véus e palavras.
Olhos vidrados de olhar!

Da persistência desponta a obra,
comunhão absoluta de desejos inesgotáveis.
De olhos postos em Outro-de-si,
quando olhar o Outro é perder-se de si. 
(Troyka Manuel)



quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Sendas de rumor

soltam-se rumores, trágicas comédias medíocres
de bem falar mal de tudo existir e acontecer
soltam-se gritos entre ameias de castelos esquecidos
e entre véus e teorias vão-se definindo as regras

gelo que derrete a sanguínea fúria do vulcão
doido embarrigado na vontade do fogo cuspir
soltam-se as bestas livres em carrossel parado
à espera de viv' alma  
que o sopre sustente movimente 
carrossel de fundo abismo lento 
como Zéfiro-Vento entre ninhos de Primavera

incendeiam-se rasgos de luz em clara noite longa
burburinhos em eco flamejante
e gastam-se as horas, o tempo, o escuro
vivendo de fingir ser
como almas penadas estrangeiras de si

numa senda que não é minha nem é tua
(Troyka Manuel)

sábado, 5 de outubro de 2013

[Éramos sangue em silêncio]

Éramos sangue em silêncio.
(Mudo sangue!)
Corria nas veias a densidade de sermos juntos,
a meia lua, o sol alto, a estrela cadente
- paridos de um coração qualquer,
hesitantes, acomodados, vingados.

Éramos a mesma água, o mesmo balde
numa terra de ninguém,
sem espinhos e sem traça.

Éramos fúria-tensão-espingarda
sem tiros nem mortes.
Somente mudos (Sempre mudos!),
calados-esquecidos,
desconhecidos de uma vaga-falsa esperança
que nos sorveu as mãos, o sangue e a vida.
(Troyka Manuel)

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

"Lithos" (etim. Grega - "Pedra")

Da pequena pedra rude
se constrói um destino,
uma estátua, um edifício.
Retumba a crueza dos nortes 
empedrados,acastelados de sentir.
Noites sem vento,
erosão degradada em nada.
Rude pedra, enfim,
modelada de pequenos fins.

Estão sós as pedras do rio,
frias, líquidas,
à espera de um destino:
molde inefável da sua Potência
de Ser mais e mais.
Deserta-Ilha de recriar
e sempre se Transformar.

Pequena pedra de vir-a-ser...
(Troyka Manuel)

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

O Pagem, Mário de Sá-Carneiro












Sozinho de brancura, eu vago --- Asa
De rendas que entre cardos só flutua...
--- Triste de Mim, que vim de Alma prà rua,
E nunca a poderei deixar em casa...

                      Mário de Sá-Carneiro


terça-feira, 1 de outubro de 2013

Mito de Sísifo

Relendo Miguel Torga, recordo Sísifo, personagem da mitologia antiga que desafiou a morte e os deuses, sendo por isso condenado a empurrar um enorme pedregulho, com as suas mãos, até ao cume de uma montanha. A cada vez que atingia o cume, a pedra rolava novamente até ao ponto de partida, tendo Sísifo de executar a mesma tarefa durante toda a eternidade. 
Ora, este Mito (repegado de forma interessantíssima por Camus em O Mito de Sísifo)  conduz-nos precisamente à ideia do "absurdo", à noção comezinha dos "esforços inúteis" da monotonia que, tantas vezes, nos toca na pele e tentamos repudiar. Há esforços e endereços inúteis, de facto, contudo já os latinos diziam: "Inutilia truncat" (cortar as coisas inúteis), acabar com as inutilidades. E quantas vezes temos o poder de interromper este trabalho sisifiano, encarar outros caminhos e possibilidades, criar e recriar aquilo que é rotineiro e absurdo, introduzindo a novidade, a surpresa, a superação!?
Nem tudo é necessariamente sisifiano e sem esperança. O que importa mesmo é "Recomeçar" sempre, desbravar novos trilhos, empurrar a pedra para outros cumes.
As paisagens que podemos contemplar de cumes diferentes esperam por nós e estão ao nosso alcance!  

Sísifo
Recomeça…
Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo
Ilusões sucessivas no pomar
E vendo
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças.

Miguel Torga, Diário XIII

domingo, 29 de setembro de 2013

[Hoje sou louco, aventureiro]

Hoje sou louco, aventureiro,
moribundo reencontrado

no cais da minha Alma.
Embarco e atravesso os mares
da pesada e negra madrugada.
Enfrento medos e tempestades,
o mar revolto de mim em-mim.

Velejo entre conchas outrora tenebrosas.
Gigantes. Assombradas.
Adamastor a dobrar
em mau tempo esperado-de-tranpor.
Monstros recriados em torturas imaginadas.

Hoje sou louco, aventureiro
do tempo perdido-reencontrado,
linha-limite por si superada.
Ilha em falsa erosão (e eu crente!)
que reencontra o Continente-de-si.

Hoje vislumbro uma luz ténue e trémula:
Reencontro do que um dia já fui.
Arco com flecha certeira. 
Convicto Tritão, amante de uma Sereia incógnita.
(Troyka Manuel)


terça-feira, 24 de setembro de 2013

Ernesto Sampaio

Assumo que desconhecia o autor.
Todavia, depois desta leitura, com toda a certeza tenho muito mais a explorar.
Porque foi assim... surpreendente!
(Obrigado, EP!)


... Sós, ambos, na estrada, nos confins mais remotos, tu já dentro da noite e eu à beira dela... 
Sós, de mão dada, com os olhos encantados pela imensa pérola luminosa da morte...
Ernesto Sampaio in Fernanda
Para conhecer melhor Ernesto Sampaio: In Memoriam

Requiescat in Pace António Ramos Rosa

Honra ao poeta que hoje perdemos!
RIP - 23 de Setembro de 2013

Não Posso Adiar o Amor 

Não posso adiar o amor para outro século 
não posso 
ainda que o grito sufoque na garganta 
ainda que o ódio estale e crepite e arda 
sob montanhas cinzentas 
e montanhas cinzentas 

Não posso adiar este abraço 
que é uma arma de dois gumes 
amor e ódio 

Não posso adiar 
ainda que a noite pese séculos sobre as costas 
e a aurora indecisa demore 
não posso adiar para outro século a minha vida 
nem o meu amor 
nem o meu grito de libertação 

Não posso adiar o coração 

António Ramos Rosa, in "Viagem Através de uma Nebulosa"

"Não posso adiar o amor", dito por José-António Moreira


domingo, 22 de setembro de 2013

[Reencontro repentinamente o Mundo]

Reencontro repentinamente o Mundo
e não o reconheço
(Cresci noutra ilha e não percebi).
As tardes são belas, quentes, solarengas,
mas os transeuntes são estranhos fantasmas
que se arrastam:
térreos de existir,
surdos de ver-sentir.


Sigo o impulso repentino:
Envolvo-me na multidão andante
e reconheço alguns passos, pelos pés.
Mãos envelhecidas, pequenos movimentos,
o andar desengonçado-penoso.
Caminhos que trilhei?
Mãos que me tocaram?

Não compreendo a multidão-fantasma,
não me vos reconheço,
e transformo-me então em estado-transeunte,
simbiose perfeita-aterradora.
Embarcação encalhada em mar revolto...

Hoje, reaprendo o preço
de estarmos sós,
de costas viradas,
acidentados em caminhos que não cruzam almas
que se fogem, sempre fugazes.
Muros intransponíveis!
Cruas cercas de fuga que se levantam 
para nunca mais deixarem de crescer.

Para quando o negro deixará de ser a diferença do rebanho?
(Troyka Manuel)

sábado, 21 de setembro de 2013

Caoticamente

Do caos, a polifonia.
Da melodia simples, a serra que corta:
pensamento falhado, simples, rasteiro.

Do caos, a visão absoluta,
resolução sábia do viver sentido.
Esferas que rolam e que gritam.
Sangue absurdo, gumes adiados.

Do caos, a vida!
A sensação.
Vastidão de olhares.
Cosmopolita visão de alguém
que um dia se atreveu a sentir.

(Troyka Manuel)



segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Encontro

coração que arde em frio
vista densa e atenta
encomenda inóspita-franca
sabor grave de bancos enfadados
cabos massivamente ligados
em rodopios de aranhiços

não importa

gosto de sentir o Outro
apertar a vida e as mãos
sentir
o Outro

sentir
Outro
sentir

(Troyka Manuel)



Ibrahim Maalouf - Your Soul por PuertoLibre

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

[Armam-se os titãs da guerra]


(Para AC)

Armam-se os titãs da guerra,
ergue-se o escudo de Aquiles,
parte para dentro de ti.
Cresce já a flor sem murchar
e os pesadelos deixam de ser.
Nascem os sonhos, acontece a vida,
liberdade temida-ansiada!

É o barco que arranca a sua âncora,
lentamente,
despejado do vazio atracado.
Escangalhado de tudo o que não era,
renascido em estaleiro de luxo.
Renovada-fresca Alma.

Do nada ergue-se a Matriz,
o verso solto, o amanhã:
Tempo de ti, Tempo de mim.
Despem-se as roupas rotas do hábito
fervilhado de becos sem trilho.

Caminhamos em frente!
Caminhamos rumo ao azul do Sol!
Caminhamos de frente!


(Troyka Manuel)

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Excerto do Poema "21"

"(...)
Entoo o canto do crescimento e do orgulho, 
Já nos humilhamos e imploramos bastante, 
Provo que tamanho é apenas desenvolvimento. 

Ultrapassaste os demais? És o Presidente? 

Isto é uma insignificância, todos lá chegarão e até ultrapassarão. 

Sou o que caminha com a noite que se estende ternamente, 

Grito para a terra e para o mar semi-envoltos pela noite. 

Aperta-me, noite, em teu peito desnudo – aperta-me, noite, magnética e nutritiva! 

Noite de ventos austrais – noite de grandes e raras estrelas! 
Noite silenciosa que me saúda – noite estival louca e desnuda.
(...)"

Walt Whitman

Canção de Mim Mesmo
Tradução de Alita Sodré

(Obra em pdf)



quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Antiguidade-Presente

In: http://olhares.sapo.pt/colunas-gregas-foto2209817.html
Assaltam-se as vozes,
rumores de outra vida,
antiguidades de uma existência
sem-espaço-tempo.
Recortam-se os versos,
a História, o fio, o pensamento...
Caem ruas desertas, cães sem dono,
cabeças perdidas, corpos gelados inertes:
uma antiguidade presente-esquecida.

Ruínas. Ruínas! Ruínas...

Máscaras de outro tempo,
espelhos de hoje, 
girassóis desnorteados
de amanhã-sem-céu.

Tenho artérias enjauladas de sangue
que se alimentam de Passado,
povoado por vozes da Antiguidade.
(Troyka Manuel)



"Requiem", por Dulce Pontes e Estrella Morente, em Mérida